terça-feira, abril 07, 2009

Cena Cinza

A cena é o finito do palco. Corta o horizonte trágico nas escadarias dos palácios de onde emanam as mortes dos nobres. A cena é o tempo: o atemporal que nos temporaliza, a nos impor a triste ou jubilosa condição da nossa finitude, a condição de que todos os estados de coisas – todos os sentidos – são efêmeros. A cena é o Hades.

A cena propõe o entendimento. A cena localiza. A cena é a lucidez do protagonista, sua pertinência, para onde convergem as ações e de onde parte o futuro. Sem cena, não há porvir; sem cena, o eterno é apatia, é tédio, o sempre-igual do sempiterno. A cena é o fim, como fim que interrompe o curso das coisas, mas também como fim que o curso das coisas deseja. A cena é o Céu.

No fim, o que foi são cinzas. Cinzas, escombros do passado que não tornará a ser, senão como fantasma eternamente recorrente na sua indefinível cor de cinzas, o cinza do espírito que se disfarça em nossas palavras e feições.

E se a cena é cinza? O fim do horizonte se camufla com passado e nos oferece nada. Melhor, oferece o nada, e não apenas nada. Eis que o passado com que se une é o nosso próprio, anunciando nossa futura finitude. O nada nos localiza: na corda sobre o abismo, oferta-nos inexorável e generosamente a reflexão. A cena cinza não dá repostas – tudo está cinza! –, obriga-nos a buscá-las antes que o nada concretize sua ameaça.

Porque estamos no horizonte demasiadamente aberto, perdemos os sentidos. A cena cinza perturbará, não porque nos colocará no nosso lugar, mas porque já estamos nele sem perceber. Ela espelha, mas não multiplica os homens.

Um comentário:

Chrysantho Sholl Figueiredo disse...

Foi roubado! Mas pq não me avisasse teste texto antes??? Que tal usá-lo para uma eventual divulgação da revista ou como manifesto da própria revista???