Um cadáver. Ah! Quantos e quais são os dias de horror e mediocracia não sentidos que me aguardam agora que te vejo cadavérica, lutando contra vermes? O que de mim destruirá o húmus que te consome e me condena? A mim antes de tudo, que mais te amo. Crueldade! Se pelo menos tudo desaparecesse, até mesmo o vil legado da boa lembrança, da tua boa lembrança, a possibilidade do que eu poderia ter sido se houvesse te protegido, meu bem. Como és linda, nem mesmo a Morte a separou da Beleza. Não mesmo, e, aliás, como de crueldade tudo entende, sua foice levou-te a ti e contigo tudo o que de belo há e poderia haver no planeta. Sim, os dias agora serão sempre cinza, porque o azul ninguém saberá ver. A música não será mais que o silêncio, e o silêncio nada mais que olhares impessoais e insuperáveis. Adeus, Transcendência!
Chora agora, homem! Chora também, mulher! Aproveitai, pois, as últimas horas de sentimento estocados em vós, que amanhã ninguém, ninguém há de se alegrar, ninguém há de chorar. Aliás todos seremos ninguém. Estamos condenados a beber dos venenos que levaram a minha linda que com os vermes jaz. E foram tantos, não é, meu bem? Vamos e bebamos, vamos perder nossa condição de homens e mulheres, de crianças e velhos, de casados e solteiros, de amantes e inimigos! Vamos todos sorver o trabalho, a petição, o poder, a posse, o requerimento em três vias com reconhecimento de firma, a produção, a curva de Philips, o superávit primário, o recurso extraordinário, a propaganda, o custo/benefício, o dinheiro, a ginástica laboral, a gonorréia, a medida provisória que reajusta a alíquota do imposto sobre a renda do prestador de serviço para 40%, a fábrica, a circuncisão, o cinto de eletrodos, a cópia autenticada, o reflorestamento, o beijo entre Gisele Bündchen e Leonardo de Caprio, a máquina digital de 456.98 megapixels, a.........
Hoje, eu vos declaro robôs e vos participo: a poesia morreu.
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