quinta-feira, maio 22, 2008

Lógica do sentido: a boca (ou Estudo do sorriso)

Tua boca é muita. Tua boca é tanta. Na tua boca não hão de caber sorrisos: teus lábios exageram, preenchem todo o vão e vão além; excedem-se nessa curvatura maliciosa que se insinua contra o mundo, ao que com humilde parcimônia o vocabulário oferece a simples palavra biquinho. Tua boca é tanta - não hás de sorrir, não hás - tua boca é muita. E no entanto um movimento se desenha, os cantos se distanciam, teus olhos se espremem, uma muralha de marfim se descortina. Sorris!, e sorris contra todo prognóstico da minha futurologia, que se demasia em lógica. Sorris tão grandiosamente quanto são enormes as carnes que se ruborizam nos travesseiros dos teus beiços, sorris com tantos dentes quanto são os golpes que explodem nas minhas costelas toda vez que o fazes. Como diabos sorris sem apertos, como diabos o sorriso vence tamanhos lábios, como diabos cabem sorrisos e lábios em tua boca? É sorriso de feiticeira que me prostra no evasivo sentido da tua boca que tento compreender. Tua boca acaba no sorriso: encerra-se ali o seu significado. Tua boca é isso, não entrada para o teu ser, não cavidade bucal. Ela é a saída, teu desabrochar para meus torturados olhos (amantes de lábios e dentes), ela se resolve inteira neste simples plano do teu sorrir. Para que investigar suas profundezas, onde tudo é falso? Tua boca acaba nos teus dentes ostensivos, tua boca me basta aí. É bastante, é muita, é tanta.

Um comentário:

Pamela C. disse...

Não me canso de ler esse texto!
É tão cheio, entende?
Ele vai completando o [meu] vazio enquanto leio, para que ao final volte a esvaziar, já que seu conteúdo é particular!

Acho que devia mandar esse texto para concursos! =P

;)