domingo, janeiro 17, 2010

Algumas anotações sobre a poesia

A grande proeza e o grande fim da poesia é conferir a si mesma regras rígidas que impeçam a intuitiva articulação da linguagem submetida ao sentido e simultaneamente a necessidade de fazer transparecer algum (não este, não aquele) sentido. A verdadeira poesia, que desde já se ressente de uma palavra como "verdadeira", fará jus à sua categoria quando alcança o melhor equilíbrio possível dessas duas realidades antagônicas, e isso não se faz se não com uma profunda violência que não busca concessões nem da manifestação irrefreada do sentimento e do êxtase, nem do cálculo frio dos metros, dos ritmos e (a partir do profícuo intercâmbio entre poesia e arte plástica levado aos limites de sua potência pelo concretismo - ao que parece a última vanguarda respeitável), da configuração espacial do próprio poema.

Aos que vindicam a liberdade, dá-se o apreço dessa arte que, em verdade, nunca a negou, ao contrário do que pensam alguns vanguardamaníacos que insistem num berro iconoclasta contra ídolos já sepultos. Em poesia, liberdade não é o desbunde gratuito, pois até o desbunde é responsável consigo mesmo dentro das regras que escolheu - e nessa escolha está a verdadeira liberdade - respeitar e sacralizar. Toda profanação poética deve, pois, ser uma espécie de religião.

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